Não perca seu amor na balada

Como em toda polêmica sobre propaganda, gosto de acreditar que todo mundo tem razão e ninguém trabalhou até tarde para causar a infelicidade dos outros

Às 14h52 da tarde do dia 25 de julho de 2012 o placar da página “Perdi meu amor na balada” no Facebook era o seguinte: 96.319 curtiram; 38.613 falando sobre isso. O vídeo, em que um ator finge ser um cara que perdeu o telefone da mulher dos seus sonhos na balada e pede ajuda pra geral, postado no YouTube no dia 10 de julho, já atingia 978.948 acessos. E a ação, criada pela agência NaJaca (assim tudo junto mesmo) para lançar o celular Nokia 808 PureView (também assim tudo junto mesmo), continuava gerando agressivas discussões na rede virtual, em elevadores, chás de bebê e até no Procon.

Na própria página do Facebook, Karina Ravagnani Silva postou o comentário: “Que ridículo isso!”, apoiado por cinco likes. Rebeca Porpino, mais radical, postou: “Que absurdo! A Nokia está abolida da minha vida”, apoiada por oito simbolozinhos positivos. Já mais cordata, Jade Dionísio Barreto dizia: “Muito inteligente, muito mesmo...Mas fiquei p... da vida hahahahahahahah”, mas não ganhou nenhum curtir. Bem como a Carolina Paulino, que também gostou: “Essa galera da Nokia mandou muito bem.” O atualizado Jeff Chagas, certamente usuário de smartphone,­ contribuiu com o ponto mais interessante: “Kkkkkkk... Esse negócio de anotar número de cel em guardanapo é tão anos 1980... Kkkk. Hj em dia a gente add no Facebook na mesma hora!”, também recebendo oito sinais de apoio por tocar num ponto mais do que importante pra essa história toda.

Como em toda polêmica sobre propaganda, gosto de acreditar que todo mundo tem razão, todo mundo deu seu melhor e ninguém ficou trabalhando até tarde para causar a infelicidade dos outros. Então, vamos analisar os fatos pra ver se a gente aprende alguma coisa.

Primeiro imaginando que somos do marketing da Nokia e precisamos empurrar para a galera um celular que o site da revista de tecnologia americana Wired classifica como “excelente câmera. Todo o resto agonizante” e “...O mais excitante celular do mercado que você não deveria comprar”, terminando com “a experiência (do sistema) Symbian?

Em uma palavra: frustrante.” Ou seja, uma bomba. Pela bagatela de R$ 2 mil. Como todos nós faríamos, eles se agarraram à notícia boa: chegou o Nokia com uma câmera que tem um zoom superbom!

Nós nos colocamos, então, no papel da agência NaJaca, que recebe este briefing e, munida de uma verba que não pode ser grande, faz o que todos nós faríamos: bola uma ação com vídeo no YouTube e página no Facebook, mídias baratas e interessantes. O único porém, e um porém muito importante, é que a campanha vinha mascarada como uma ação verdadeira feita por um homem apaixonado de verdade.

Até aí, novamente, todo mundo tem razão. Ou não?

Para o Conar, que diz no artigo 9o do código de autorregulamentação publicitária que toda campanha publicitária deve ser ostensiva e necessariamente identificada como propaganda, parece que não. A minha opinião é que a campanha desrespeita um princípio básico da relação entre marca e consumidor: a honestidade de propósito na comunicação.

O pessoal que defende a campanha, em sua maioria gente que trabalha com marketing, propaganda e web, e que em nenhum momento foi enganado pelo vídeo original (afinal, quanto mais hipster você é, menos pode ser enganado por virais) acha que quem acreditou na história é trouxa e tem mais é que se ferrar. É claro que nenhum deles trocaria seu iPhone por um Nokia desses nem sob risco de morte ou mutilação. Ou seja, quem gostou da campanha não vai comprar o produto.

Já o pessoal que acreditou na história e por conseguinte se sentiu muito enganado — especialmente as mulheres românticas que, como se sabe, não curtem muito uma traição — também não vai comprar o 808 PureView a julgar pelos comentários postados na rede.

Finalmente, aproveitar-se de emoções honestas e positivas para vender produtos desvantajosos para o consumidor não é uma boa estratégia de negócios. A verba mundial de publicidade gasta para vender esse trem deveria ser investida em pesquisa e desenvolvimento de produtos que não fossem ridicularizados pela crítica especializada. Tentando vender um produto bomba com uma ação de marketing camuflada a Nokia acabou detonando parte do valor conquistado pela sua marca no Brasil.

Rodrigo Leão é sócio-diretor de criação da Casa Darwin e professor dos MBA de Marketing, MBA Executivo Internacional e International MBA da FIA. Uma vez por mês ele escreve artigos para Meio & Mensagem. Este texto foi publicado na edição 1521, de 06 de agosto.

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