Só que os jukeboxes eram enormes, e alguns possuíam vários toca-discos embutidos, para que a pessoa que inserisse uma moeda pudesse ter mais opções na hora de escolher uma música. Mesmo assim, as opções eram poucas: os maiores aparelhos ofereciam até 48 canções.
Eis que, em 1935, Ken Shyvers, um inventor cujo crédito é atribuído para a criação da máquina de pinball, pensou em uma ideia de aparelho mais compacto, que pudesse ser levado à uma mesa de lanchonete, e que tivesse um leque de opções maior. Como ele idealizou o conceito? Em um serviço de audição de músicas por telefone.
Mesmo em um tempo distante, a ideia de transmissão de conteúdo em meio eletrônico não era exatamente inovadora. Precisamos voltar ainda mais no tempo para descobrir isto. Em 1881, Paris foi o local onde Clément Ader implantou pela primeira vez o Théâtrophone, um serviço de distribuição de conteúdo de áudio também por telefone, mas que oferecia, como o próprio nome diz, peças de teatro e óperas a serem ouvidas pelo cliente.
Em nota redigida em 11 de novembro de 1881, Victor Hugo descreveu sua experiência com o Théâtrophone como "prazerosa". Em 1884, o rei D. Luís I de Portugal decidiu fazer uso do sistema quando não pudesse comparecer à opera pessoalmente. O diretor da Edison Gower Bell Company, responsável pela instalação do Théâtrophone nos aposentos do rei, foi condecorado com a Ordem de Cristo.
Naquele mesmo ano, a tecnologia do Théâtrophone foi disponibilizada na Bélgica, e no ano seguinte, em Lisboa. Na Suécia, a primeira transmissão telefônica de uma apresentação operística ocorreu em maio de 1887, na cidade de Estocolmo.
Em 1890, MM. Marinovitch e Szarvady compraram a invenção, fundaram a Compagnie du Théâtrophone, e passaram a comercializar o serviço. Além de performances de ópera e teatro, a empresa oferecia, em horários determinados, noticiários de até cinco minutos de duração, que era o tempo máximo de audição disponível ao preço de cinquenta cêntimos, ou centavos para nós.
Considerado o primeiro serviço público de entretenimento em transmissão por demanda, o Théâtrophone ainda tinha, pasmem, disponibilização de serviço por assinatura! O sistema funcionava com tíquetes contendo pacotes de audição por quantidade a preços mais baixos. O assinante mais famoso foi o escritor Marcel Proust, que aderiu ao serviço em 1911.
Sistemas similares ao Théâtrophone foram criados ao redor da Europa: por volta de 1893, em Budapeste, foi disponibilizado o Telefon Hírmondó, que, em húngaro, significa "jornal por telefone", que oferecia notícias e entretenimento para assinantes. O Electrophone foi criado em Londres, em meados de 1895, e disponibilizava para audição performances de teatro, espetáculos musicais e missas dominicais.
Já nos Estados Unidos, sistemas semelhantes ao Théâtrophone foram limitados a experimentos únicos. O historiador Erik Barnouw reportou que, no verão de 1890, foi organizado um concerto que foi transmitido via telefone. No Grand Union Hotel, em Saratoga, por volta de 800 pessoas ouviram uma transmissão telefônica da The Charge Of The Light Brigade, que foi regida no Madison Square Garden.
Inspirando-se nas experiências anteriores de outrem, Ken Shyvers e sua esposa, Lois, criaram o Shyvers Multiphone, um aparelho que media 19 centímetros de largura e meio metro de altura, e era conectado à uma tomada de energia elétrica e à uma linha telefônica.
Então o cliente respondia, através de um microfone, instalado na parte superior do aparelho, pedindo a música desejada, dizendo o seu número correspondente, escrito em uma lista ao redor do aparelho. Aí, a atendente pegava o disco de vinil, acionava o fonógrafo, e a canção era transmitida pelo telefone até os auto-falantes do Shyvers Multiphone.
No auge de sua popularidade, nos anos 1940, haviam oito mil aparelhos em uso, principalmente na Costa Oeste, e até 170 opções de músicas para escolha. Os últimos modelos pediam uma moeda de dez centavos para operarem.
Havia até mesmo um código de conduta a ser seguido pelas atendentes do Shyvers Multiphone: pousar a agulha gentilmente sobre o disco, não travar o toca-discos para ler o título da canção, e não era permitido marcar encontros pelo sistema telefônico.
Este sistema genial de transmissão de música, porém, tinha uma falha: como o pedido era feito por voz, uma pessoa pedia, por exemplo, o número 297, e outra pessoa atrás dela, de forma sacana, poderia pedir o número 185. Assim, as duas músicas seriam executadas ao mesmo tempo, estragando o prazer de quem gastou a moeda.
No entanto, graças à mesma tecnologia, não é difícil encontrar adaptações do aparelho usando dispositivos eletrônicos que detectam que a pessoa inseriu uma moeda, reconhecem o pedido pela voz, e tocam a música desejada, fazendo um Shyvers Multiphone funcionar de forma nostálgica.
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