Senna: mais do mesmo, menos do essencial


Eu fiz a pré-compra do DVD, esperei quase um mês pela sua chegada. A expectativa depositada no documentário sobre Ayrton Senna, um dos maiores e mais carismáticos pilotos da história da Fórmula 1, ficou um pouco frustrada pela falta de componentes essenciais para uma maior compreensão da sua carreira.

A começar pela sua história nas categorias de base, depois de subir do Kart para as Fórmula Ford 1600 e 2000, e na Fórmula 3 britânica, duelando com Martin Brundle por espaços nas pistas de asfalto. Depois, na Fórmula 1, falhou em mencionar a atuação patética que Ayrton teve no GP da Austrália de 1985, onde andou em todas as partes do circuito, inclusive, embaixo de uma arquibancada.

Além disso, deixaram de ser citadas a chegada em Jerez de la Frontera, com apenas 14 milésimos de vantagem para Nigel Mansell, uma das menores diferenças de chegada da história da Fórmula 1, os duelos com Nelson Piquet, na Hungria, Jean Alesi, em Detroit, Nigel Mansell, em Mônaco, e Alain Prost e Michael Schumacher, em Silverstone.

O que senti assistindo ao filme é que parece que tentaram passar uma imagem de um Ayrton Senna indefectível, sem defeitos. Mas, quem conhece bem a carreira dele, sabe que não foi bem assim. Até 1988, em Mônaco, quando bateu na saída da Portier, a cinquenta segundos de Alain Prost, e foi direto a seu apartamento, que ficava a poucos metros da pista, sem dar satisfações, demonstrava ali uma personalidade um tanto difícil de lidar, um piloto afoito, que não sabia medir as consequências de uma pilotagem apressada, mesmo estando a tantos metros de distância do rival mais próximo.

Naquele momento, Ayrton Senna sofreria um grande sacolejo em sua carreira. "Acordou" para a realidade, descobrindo que nunca seria campeão com essas atitudes, apesar da tremenda velocidade. Acabou vencendo o campeonato daquele ano, com atuações ao volante que fizeram muitos esquecerem a patetice que cometeu perto do túnel de Monte Carlo.

É claro que o filme tem as suas qualidades. A começar pelas imagens inéditas: da reunião entre Jean-Marie Balestre, Alain Prost e Ayrton Senna, depois do Grande Prêmio do Japão de 1989, filmada da frente do pódio, das imagens de arquibancadas, mostrando de um outro ângulo o acidente que matou Roland Ratzemberger, e os momentos com a família nos bastidores.

Apesar da tentativa de Asif Kapadia e Manish Pandey em produzir algo único, ambos falharam ao não reproduzir momentos cruciais da carreira de Ayrton, como os mencionados acima. A impressão que tenho do filme é que mais parece um "Ayrton Senna para quem nunca ouviu falar".

No entanto, o registro é válido, sobretudo para quem não é brasileiro ou não vivenciou a relação da ferrenha torcida com Ayrton Senna, e sempre buscou compreender melhor a paixão desse povo pelo piloto, um povo que sofria na época com um período de inflação monetária estratosférica, várias mudanças de moeda, problemas sociais e políticos, e que encontrava nas manhãs de domingo um dos raros momentos de alegria.

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