Após o estágio, as repercussões nos meios de comunicação se concentraram quase que inteiramente ao retorno à plena forma física de um piloto cuja estrela diminuiu seu brilho nos últimos anos. O que não mereceu menções, no entanto, foi que Nairo Quintana estava com uma bicicleta equipada com freios a disco.
Competindo pela equipe UCI Pro Continental Arkéa–Samsic, Quintana estava com o quadro Canyon Ultimate CF SLX Disc, transmissão Shimano Dura-Ace R9170 Di2 e versões tubulares das rodas Dura-Ace R9100 C40 Disc com, como o próprio nome da peça explicita, freios a disco.
O sistema de freios a disco pode fazer as bicicletas speed que o possuírem dominarem o World Tour em 2020, mas não será fácil esquecer as controvérsias que marcaram sua introdução ao circuito profissional, como as preocupações com a segurança do atleta e o enorme peso do equipamento, inicialmente impedindo a implementação em massa em bicicletas construídas para desenvolverem altas velocidades.
Em janeiro de 2017, Tom Boonen foi o primeiro atleta a vencer no circuito da UCI usando uma bicicleta equipada com freios a disco, no Tour a San Juan, a bordo de uma Specialized S-Works Venge ViAS. Agora, em 2020, Nairo Quintana, um especialista em subidas de montanha, vencer uma etapa deste tipo, ainda por cima, uma das mais icônicas do esporte, com freios a disco, sem que ninguém sequer encostasse em seu pneu traseiro, mostra o quanto a tecnologia evoluiu a ponto de fazer com que uma bicicleta speed com freios a disco passasse de coisas tão distantes quanto o diabo e a cruz se juntassem e formassem um conjunto vencedor.
Como qualquer outra tecnologia no ciclismo, é fácil argumentar que os freios a disco em bicicletas speed são meramente uma tática comercial, e que a indústria quer que todos acreditemos que os freios do tipo "ferradura" são obsoletos e devem ser imediatamente enviados para a sucata, simplesmente para que possam tirar mais do nosso suado dinheiro.
Embora haja, sem dúvida, uma certa verdade nisso, na realidade é difícil argumentar com o fato de que, em termos de desempenho, os freios a disco hidráulicos possuem várias vantagens sobre os freios acionados por cabo, especialmente se você usa rodas de carbono.
Até a diferença de peso entre os sistemas de rodas e freios a disco tornou-se irrelevante. Muitas marcas agora oferecem bicicletas speed com freios a disco cujo peso total está abaixo do limite mínimo definido pela UCI, que é de 6,8 kg.
Obviamente, talvez você não precise dessa vantagem, mas, na vanguarda do esporte, as vitórias são mais importantes, mesmo que algumas equipes e pilotos ainda não tenham participado desta mudança. O ciclismo é um esporte que tem um forte apego pela tradição, mas os pelotões superiores com certeza irão se livrar de tecnologias ultrapassadas em favor do progresso.
Por exemplo, Sean Kelly permaneceu usando cintas para prender os pés nos pedais até 1993, apesar da Look ter inventado seu sistema Keo, que não possuía tal artefato, quase uma década antes. E assim foi também com, por exemplo, os pneus tubulares, válvulas prest e os sistemas de transmissão atuais. Não é porque surge algo novo e melhor que devemos jogar fora tudo o que temos no momento, mas também não devemos fingir que as coisas antigas são melhores apenas porque estamos acostumados a elas.
Enquanto uma vitória na classificação geral de um Tour com freios a disco permanece ilusória para as equipes de redação das grandes mídias, caso os freios a disco assumem a ponta de todos os tipos de corridas envolvendo bicicletas speed, até os fanáticos por freios rígidos terão que admitir que os conjuntos de pastilhas e discos de freio se tornarão o novo padrão a ser seguido.
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